quinta-feira, 19 de setembro de 2019

191 e turma do Michel


Coração materno (Paulo Mendes Campos)
Duas horas da tarde. Ali no inicio do Morro da Viúva fizeram sinal: duas senhoras, ambas de cabelos brancos, preparavam-se para entrar no lotação, quando o motorista gritou: “Um lugar só”. A velhinha mais velha, já com o pé colocado no carro com imensa dificuldade, conseguiu retirar a perna comprometida, com dificuldade ainda maior, sob protestos persuasivos da velha mais moça, que dizia:
- Vai mamãe, vai a senhora, eu vou em outro.
A mãe se desmanchando em timidez, medo e bondade, sorria:
- Não, minha filha, eu não posso te deixar aqui sozinha.
- Vai, mamãe.
- Não, minha filha.
- Pelo amor de Deus, mãe; o homem está esperando.
- Mas... minha filha?!
Os passageiros aguardavam com a tolerante paciência de quem tem ou já teve mãe. O motorista fez força ( e o conseguiu, parabéns) par refrear a sua fúria de Averno.
- Vai, mãezinha; aqui neste ponto é difícil arranjar dois lugares.
- Não posso te deixar sozinha, minha filha. Nunca!
Diante do impasse, levantou-se, resoluto, um senhor sentado no banco da frente, oferecendo-se para ir em pé, as duas senhoras iriam sentadas. Ah, mas isso não, aparteou o motorista, era contra o regulamento, dava multa. O amável passageiro descompôs o regulamento do trafego e os demais regulamentos: eram desumanos. Ao pé da calçada, o torneio sentimental de mãe e filha continuava.
- Vai, vai, mamãe.
- Não posso ir sem você, minha filha.
Quem viu a necessidade eventual de perder docemente a paciência foi a filha. Usando de energia adequada ao momento, segurou o braço da velhinha (mas velhinha mesmo, frágil, frágil), empurrou-a com o mínimo de força necessária, proferiu uma ordem imperiosa:
- Vai, mãe.
E a velha mais moça se afastou em passadas compridas, impedindo a contramarcha da velha mais velha, que estava no limite extremo de sua timidez, e não teve outro jeito senão agarrar-se ao braço do motorista, entrar penosamente, sorrir pedindo perdão para todos os passageiros. Ajeitou-se no banco, esperou o barulho do motor e comentou para a vizinha (que a olhava, compreendendo tudo, as velhas, as mães, os cosmos):
- Coitadinha! Eu fico morrendo de deixar ela aí, só, tão longe!
Longe de onde? Das entranhas que criaram uma menina. Longe. Só.
A viagem para o centro foi recomeçada, sem novidades, todos voltaram para dentro de si mesmos, esquecidos do episodio. A mãe, no entanto, furtiva (certa de que já causara bastante transtornos naquele dia) inspecionava todos os lotações que ultrapassavam o nosso, aflita em sua inquietude, buscando lobrigar a filha. Mas foi só, quando o lotação entrou na Avenida, e parou diante de um sinal, que, enfim, a velha mais moça, a filha, apareceu em um lotação ao nosso lado. As duas se sorriram como depois de uma longa e apreensiva travessia.
A velhinha chegou a fazer graça:
- Graças a Deus, minha filha! Você ainda chegou antes de mim.
- Eu não disse, mãe, que não tinha perigo?
A filha desceu na esquina, chegou ate perto da janela do nosso lotação, segurou a mão de sua mãe:
- Agora vai direitinha, viu?
- Você pode ir descansada, minha filha.
O lotação arrancou de novo, gestos de adeus, a harmonia voltou ao rosto da nossa velhinha, que tranqüilizou também a vizinha de banco:
- Ela vai trabalhar no Ministério; eu vou para casa; moro no Rio Comprido.
1.        Veja que o autor se preocupa em situar no tempo a cena que vai contar: “duas horas da tarde”. Isso se deve ao fato de:
a-        ser o horário em que há o menor numero de lotações nas ruas
b-       ser hora de bastante movimento
c-        ser o horário habitual das duas senhoras saírem de casa
d-       ele querer mostrar que já era bastante tarde
e-        ele quer narrar a cena com todos os seus detalhes
2.        O autor diz que “a mãe se desmanchando em timidez, medo e bondade, sorria”. As atitudes que comprovam os sentimentos da mãe, descritos pelo cronista, são todas essas, exceto:
a-        ela envergonhava-se da cena a que os passageiros assistiam
b-       ela sentia medo porque o lotação poderia arrancar de repente
c-        mostrava-se temerosa por deixar a filha sozinha
d-       pensava mais na filha do que em si mesma
e-        ela queria ser gentil com a filha
3.        Ao dizer que “o motorista fez força (e o conseguiu, parabéns), para refrear sua fúria”, Paulo Mendes mostra-se:
a-        Nervoso                                                 d- revoltado
b-       Irônico                                                   e-conformado
c-        aliviado
4.        O cronista diz que “os passageiros aguardavam com a tolerante paciência de quem tem ou já teve mãe”. Com isso, ele mostra que os passageiros assistiam à cena com:
a-        enternecida paciência                                             d- amorosa delicadeza
b-       irritada paciência                                    e- frio desinteresse
c-        tolerante paciência
5.        Respondidas as questões anteriores, você pode concluir que o principal sentimento da mãe em relação à filha era de:
a-        Piedade                                   d- proteção
b-       Carinho                                  e- compreensão
c-        abnegação
6.        Quando, finalmente, a filha resolve a questão, empurrando a mãe para dentro do lotação, ela se mostra:
a-        Resoluta                                                 d- ríspida
b-       Violenta                                                 e- grosseira
c-        irritada
7.        E a velha, ao entrar no lotação, mostra-se:
a-        Irritada                                   d- amolada
b-       Impaciente                              e- decepcionada
c-        humilde
8.        Ao comentar com a vizinha: “Coitadinha! Eu fico morrendo de pena de deixar ela aí, só, tão longe!”, a mãe queria realmente:
a-        desabafar toda a preocupação de que estava tomada
b-       satisfazer a curiosidade da vizinha
c-        satisfazer a curiosidade dos passageiros
d-       mostrar sua preocupação com a filha
e-        justificar-se do incomodo que causara
9.        “Longe de onde? Das entranhas que criaram uma menina. Longe. Só”. A alternativa que decodifica de maneira mais completa a frase é:
a-        a filha ficara muito longe da mãe que partira num lotação
b-       a filha ficara longe da mãe que via nela ainda uma criança
c-        a filha já não era aquela menina de outrora
d-       aquela mãe considerava a filha uma criança ainda
e-        aquela mãe não se conformava nunca de ver a filha longe
10.     Você deve ter notado que, no 1º parágrafo, o autor refere-se às personagens como duas senhoras de cabelos brancos: a velhinha mais velha e a velhinha mais moça. Ele não quer mostrar o parentensco entre as duas, de inicio, porque:
a-        quer mostrar a diferença de idade entre as duas
b-       quer mostrar que não havia diferença de idade entre elas
c-        quer mostrar ao leitor que ambas são muito velhas
d-       quer mostrar ao leitor que elas tinham alguma coisa em comum
e-        quer mostrar que não fazia diferença o fato de serem mãe e filha



Nenhum comentário:

Postar um comentário